galera se liga no meu tumblr FUCK ME HARD ZEUS apenas imagens do deus dos deuses mandando ver nas quebrada nao marginais



FUCK ME HARD ZEUS

Criei um tumblr para servir como database de representações pictóricas de Zeus inseminando jovens. Por enquanto só inclui imagens de zoodeifilia envolvendo Leda e Zeus encarnado em cisne, mas posteriormente garanto imagens de Danaë e o golden shower mais fértil da história, Europa e seu touro branco e Ga(y)nimedes brilhando como a estrela solitária GLBTTS dentre os amantes do deus dos deuses.

clique na imagem para ver +

É isso aí galera, forte abraço, e não se esqueçam de clicar no botão de follow!
Seu follow é a confirmação matemática do meu sucesso.

por Amanda Meirinho, em 28.2.11 | 1 comentário(s)




STALKER

Em 2005 escrevi uma resenha bem-comportada sobre Stalker, de Andrei Tarkovski. Por incentivo de terceiros procurei pelo texto nos meus arquivos antigos de e-mail e, após pesada revisão, tomo a liberdade de publicá-lo nesse blog.

Peço que perdoem meu vocabulário: eu tinha acabado de entrar na faculdade e não sabia rebolar.

***

Filmado na Estônia em 1979, Stalker relata a estranha viagem de autoconhecimento de três homens metidos num matagal chamado “Zona”. Produzido no ápice da onda esotérica do fim dos anos setenta numa república soviética assolada pelo pesadelo do holocausto nuclear (que gerou do outro lado da Cortina de Ferro filmes catástrofe como The Day After), Stalker é uma bela metáfora desses anos difíceis.

Nos anos 1950 um misterioso meteorito caiu na periferia de uma pequena cidade eslava. Pesquisadores, Forças Armadas e sábios de todo mundo dirigiram-se para o local onde se acreditava ter caído o corpo celeste; porém, ninguém conseguiu voltar para contar a história. Consequentemente, o Governo optou por isolar o lugar, chamado genericamente por “Zona”. Mas foi criada a lenda que, em determinada parte da Zona, haveria um lugar onde os desejos mais íntimos de quem nele entrava seriam realizados; o que levou alguns habitantes da cidade vizinha a organizar expedições rumo ao dito “Quarto”, desafiando assim as autoridades e a pesada vigilância policial – logo sendo chamados de stalkers.

Um stalker não é um guia comum, mas andar pela Zona não é nenhum passeio no parque. Dotada de certa aura mística, a Zona é um labirinto sobrenatural com túneis, lagos, escombros de tanques e pontes; vestígios de estranha civilização, dispostos caprichosamente por uma desconhecida força maior. Apenas os stalkers conhecem os caminhos, sempre mutantes, de acesso e de saída da Zona. A ambientação lúgubre contribui para cristalizar o tom apavorante de Stalker: o uso da luz fraca do dia, a umidade constante, a vegetação estranhamente vasta são cenário perfeito para a sucessão de estranhos eventos que pontuam o filme.

A história gira em torno de três homens, cujos nomes próprios são omitidos: Professor (Nikolai Grinko), um físico caído em desgraça que se embrenha na Zona em busca de notoriedade – e, possivelmente, um prêmio Nobel; Escritor (Anatoli Solonitsin), consagrado autor de best sellers, alcoólatra e sarcástico; e Stalker (Alexander Kaidanovsky), um rapaz de triste biografia, ex-presidiário, pai de uma menina sem pernas e desempregado. O Stalker concorda em levar o Professor e o Escritor para o Quarto em troca de dinheiro; e, após passarem por um pesado ataque da polícia, atingem a estrada de trem que os levará para a Zona.

Optou-se por registrar as imagens que envolvem a estação de trem, a família do Stalker e a feia cidadezinha industrial em sépia. Intencionalmente a fotografia adquire cores quando se atinge o território desconhecido, permeado por um intenso verde escuro: a Zona. Fazendo da cor um artifício narrativo, é iniciada a segunda parte do filme. A luz, antes rígida e cruel com os rostos cansados, torna-se diáfana. Vêem-se árvores, insetos, grama, a natureza ausente na árida paisagem da cidade. A Zona, terreno do desconhecido, revela-se um ambiente tranqüilo e abandonado – aterrorizante em seu vazio.


Ao por os pés lá o guia adquire força e autoridade, visto ser o único capaz de identificar, compreender e despistar as armadilhas impostas pelo lugar. “Sejam bons ou maus, a Zona apenas aceita os que já não possuem esperança alguma”, ele diz. “Mas, até o mais infeliz dos infelizes não sobreviverá aqui se não se comportar”. E o lugar, realmente, parece possuir vontade própria, ora favorecendo, ora atrapalhando a jornada dos seus visitantes. Vale dizer que Stalker é antes um filme sobre fé, semelhante ao Beckett de Fim de Partida e o cinema de Dreyer e Bergman, e distanciado dos estereótipos sci-fi amplamente difundidos por Hollywood – pesem nisso explosões, aliens, grandes heróis, etc. Não se encontra nessa obra de Tarkovski um só símbolo concreto da existência de seres extraterrestres na Zona; o filme captura a atenção do espectador apenas com a suspeita de que há algo de estranho por lá.

À medida que embrenham no labirinto úmido e sombrio da Zona os personagens imergem numa dolorosa viagem de autoconhecimento, assumindo seus papéis num conhecido embate filosófico: a lógica, representada pelo Professor, contra a Arte, representada pelo Escritor, e a Fé, papel dado ao Stalker. Vários diálogos são então trabadps, entremeadas por poemas, citações do Juízo Final cristão, e sermões. Faça-se nota que, em nenhum momento, a compreensão do filme é comprometida por elucubrações inacessíveis, e seu teor muito menos se desvirtua, tornando-se um pretensioso tratado filosófico.


O grande trunfo de Stalker é despir o homem ante o insondável, o desconhecido, e, quem sabe, o divino, servindo de referência para inúmeras obras posteriores. “O importante”, diz Stalker para seus companheiros ao atingirem o Quarto, “é acreditar”. A Ciência, porém, não acredita em nada mais do que em si mesma, e a Arte, em primeira instância, desconfia. De repente a água, elemento sempre presente na úmida Zona, adquire símbolos novos: é a purificação, o batismo, a tempestade no deserto. Surgem outros elementos, como um telefone que toca misteriosamente, uma revelação inesperada do Professor, e uma certa coroa de espinhos. A transformação desses símbolos em outros, de impacto diferenciado, transmite estranhamento; uma espécie de desespero ante as convenções da civilização, o mesmo horror que Conrad descreve em O Coração das Trevas, ao som do “Bolero” de Ravel.


Ao final vê-se um Stalker desolado em seu leito familiar. A falta de fé dos últimos que guiou pela Zona acaba por desgastá-lo. Com a imagem de sua filhinha doente movendo copos com o olhar, iluminada pelo sol surgido para além das usinas nucleares, ouve-se um trecho conhecido da nona sinfonia de Beethoven, o “Hino à alegria”.

***

Os textos de 2005 me matam de vergonha com suas adjetivações excessivas, advérbios inventados, mesóclises babacas e conectivos saindo pela culatra. Só fui aprender português de verdade em 2007, e olhe lá. Mas dessa resenha até que eu gosto, porque não fiquei me aventurando em assuntos que não domino. Não sei se citaria Conrad com tanta facilidade agora, que nem do capitão Marlow consigo me lembrar numa mesa de bar, mas, sabe como é: pelo menos aprendi a rebolar. =)

por Amanda Meirinho, em 27.1.11 | 3 comentário(s)




SEA CHANGE

Sea Change é o oitavo álbum de estúdio de Beck Hansen e o primeiro que ouvi com atenção. Comprei o cd na semana de lançamento, em setembro de 2002, durante uma ressaca afetiva, e desde então afogo com ele as mágoas do coração. Nem Boatman's Call, nem aquele do Bob Dylan que todo mundo cita quando leva um chute. Meu lance é o Sea Change mesmo.

Daí que recomendei o álbum para um amigo que foi dispensado pela namorada e, alguns dias depois, comentei sobre ele no twitter, onde percebi que Sea Change gera uma solidariedade esquisita nas pessoas, sendo consenso entre os que se manifestaram ser a obra "ideal" para exorcizar experiências amorosas devastadoras. Enfim; o tema me fascina, e achei por bem comentá-lo.

Não vou discutir a vida amorosa de Beck Hansen. Odeio generalizar, mas assumirei aqui que quem adquiriu o Sea change em algum momento se perguntou o que aconteceu com a ironia e a efusividade de Midnite vultures e procurou se inteirar da história por trás do álbum. Sea Change foi feito, sim, imediatamente após um fim de caso, e todas as faixas do álbum discorrem sobre a fossa. Todas. Sem exceção.

Mas Sea Change não é um álbum de grandes canções. É daqueles cuja fruição é melhor se feita pelo coletivo. É recomendável ouvir todas as faixas, na ordem, uma após a outra, para entender o que "acontece" por lá, e só então escolher uma ou outra para gravar numa mixtape.

Faço esse conselho porque é possível reconhecer padrões em Sea Change. Tudo parece concatenado, numa tentativa de racionalizar a dor, ou pelo menos comentá-la como no divã de um terapeuta. E falar sobre sentimentos não costuma ser fácil para ninguém.

Para expressar melhor meu ponto, destaco alguns trechos das faixas do álbum, a começar pela a primeira estrofe de "Golden Age", faixa de abertura de Sea Change.


Put your hands on the wheel, let the golden age begin
Window down, and the moonlight on your skin
The desert wind cool your aching head
Let the weight of the world drift away instead
Não sei discutir com proprieade a atmosfera etérea que marca o início de Sea Change, já que, de música, compreendo apenas o que me emociona. A voz de Beck parece sedada, e os sons ao redor lembram o conforto de um sono pesado e intranquilo. É como o cansaço que abraça o desconsolo, a exaustão nascida das tristezas profundas. Feche os olhos e deixe que o peso do mundo se esvaia por você: descanse.

"Paper Tiger" não abandona a exaustão de "Golden Age", mas fala, ainda discretamente, sobre a perda. Um sorriso triste, um cigarro apagado e pronto, com timidez, a lembrança vem, mas com certo resguardo, um resquício de autoironia.
Oh deserts down below us
And storms up above
Like a stray dog gone defective
Like a paper tiger in the sun
Tigres de papel não metem medo em ninguém. O papel rasga, o papel molha… a metáfora é clara.
There's one road to the morning
There's one road to the truth
There's one road back to civilization
But there's no road back to you…
Não vou usar o Modelo de Kübler-Ross porque acho uma bobagem sistematizar o sofrimento, mas se tivesse que escolher um estágio que resumisse "Paper Tiger" seria negociação. A faixa termina com a admissão de que alguém precioso se perdeu. A sinceridade é tão dolorosa que "Paper Tiger" parece ter que acabar quando se admite essa perda.

Já "Guess I'm Doing Fine" é patética. É como se alguém perguntasse se está tudo bem, e a resposta fosse "sim", por hábito, e não pelas coisas estarem bem de fato.

It's only lies that I'm living
It's only tears that I'm crying
It's only you that I'm losing
Guess I'm doing fine
A reflexão sobre a tristeza parece substituir toda o conforto sedado criado por "Golden Age"; é hora de tentar voltar, de pelo menos buscar se recompor. Mas, para tanto, é preciso conversar com a dor.

E começa "Lonesome tears".


Lonesome tears
I can't cry them anymore
I can't think of what they are for
Oh they're ruining me every time
But I'll try to leave behind some days
These tears just can't erase
I don't need them anymore
Num movimento inesperado a faixa abandona o tom apático que marca "Guess I'm doing fine" e vem o refrão, num crescente emocionado.
How could this love
Ever turning
Never turn its eye on me
How could this love
Ever changing
Never change the way I feel
Pode parecer bobagem, mas a palavra "love" só aparece em Sea Change a partir de "Lonesome Tears". Em "Paper Tiger" o termo "you" surge pela primeira vez, marcando o tom pessoal do lamento, mas não está claro que se fala de amor. Em "Lonesome Tears" a perda inconsolável, porém resignada, dá espaço para um apelo sincero.

A constatação da perda amorosa introduz outro tipo de melancolia, dessa vez diretamente conectada com a realidade exterior às dores do eu-lírico. Em "Lost Cause" o tom é outro: a faixa é expressamente direcionada para alguém, como numa conversa. As metáforas dão lugar para um desabafo objetivo e, apesar da tristeza e do cansaço, os versos expressam firmeza em sua avaliação negativa sobre o fim de um relacionamento.


Your sorry eyes cut through the bone
Make it hard to leave you alone
Leave you here wearing your wounds
Waving your guns at somebody new
A outra metade do rompimento é exposta. A situação muda de ângulo; admite-se a existência do outro, fala-se de "feridas", egoísmo, histeria… a tristeza das quatro primeiras faixas de Sea Change é explicada através de imagens desagradáveis e avaliações desacreditadas sobre o círculo social do casal.
There's a place you are going
You ain't never been before
No one laughing at your back now
No one is standing at your door
That's what you thought love was for
Sea Change não é um álbum sobre um rompimento momentâneo. É sobre um fim de caso definitivo, após todas as tentativas e esforços e last fucks que marcam o término de uma relação profunda. "Lost Cause" não fala de uma negociação entre o casal, mas de um encontro durante o desapego.

Em "End Of The Day" Sea Change segue com o tom confessional, mas o foco das atenções é novamente o eu-lírico. Dessa vez se fala de ódio, da mutação dos sentimentos, de comportamentos perante o rompimento e autoconhecimento.
I've seen the end of the day come too late
Seen the love you had turning into hate
Had to act like I didn't even care
But I did so I got stranded standing there
Standing there

It's nothing that I haven't seen before
But it still kills me like it did before
"It's Al In Your Mind" observa o desapego numa perspectiva semelhante à de "Lost Cause", onde a exterioridade é exposta e reavaliada de forma negativa. Porém, há uma fragilidade maior nessa faixa do que em "Lost Cause". Uma vez constatada a mutação dos sentimentos em "End Of The Day", não parece estar claro quais rumos devem ser tomados após o rompimento.
You're all scared and stiff
A sick stolen gift
And the people you're with
They're all scared and stiff
And I wanted to be
I wanted to be your good friend
O resultado da reflexão parece ser devastador, e dá lugar à soturna "Round the Bend".


Turn yourself over
Loose change we could spend
Grinding down diamonds
Round, round, round the bend
A dor atinge seu ápice nesse momento, pois a faixa seguinte, "Already Dead", marca uma nova fase em Sea Change: a superação.
Time wears away
All the pleasures of the day
All the treasures you could hold
Days turn to sand
Losing strength in every hand
They can't hold you anymore
Uma vez vencida a calma sedada das primeiras três faixas de Sea Change, a exposição das quatro faixas seguintes, e a tristeza sorumbática de "Round the Bend" é possível sinalizar um avanço real na desobsessão, através de doloroso processo catártico.

"Tudo passa" continua a ser a mensagem evocada por "Sunday Sun", cujo final, apoteótico e barulhento, marca a redescoberta da estabilidade emocional abalada.
There's no other ending
Sunday sun
Yesterdays are ending
Sunday sun
Em "Little One" novos rumos são sinalizados. Narrada como num sonho lúcido, essa é a primeira faixa em que o termo "sea change" aparece.


Drown, drown
Sailors run aground
In a seachange nothing is safe
Strange waves
Push us every way
In a stolen boat we'll float away
A dor parece ter sido superada. Sem o ranger de dentes, a negação, a falsa segurança e a tristeza, o que sobra? É possível enfim falar sobre o que de fato já passou.

É com alívio que Sea Change termina com "Side of the Road" e seu refrão melancólico, sereno como o conselho de um amigo.
Let it pass on the side of the road
What a friend could tell me now
Recomendo o Sea Change para todos que levam um chute porque é um bom álbum sobre aprender a ser sozinho. Tudo, no final, parece ter ficado bem: é possível encontrar caminhos, ainda que dolorosos, de se conviver com seus próprios sentimentos. As letras soam sinceras, as melodias, assobiáveis… é uma experiência mais agradável para mim do que ler um livro de autoajuda, por exemplo, mas de peso semelhante.

Bem, todos temos o direito de buscar epifanias onde quer que seja. Eu, pessoalmente, sofro até com Roupa Nova, mas esse é um segredo meu, e só quem leu esse post até o final vai ficar sabendo disso.

Uma espécie de prêmio de consolação.

Recompensa.

Esquece.

por Amanda Meirinho, em 25.1.11 | 3 comentário(s)




HEAVEN KNOWS I'M MISERABLE NOW

Então, turma, é isso. Estou precisando de um novo emprego.

Pelo meu blog dá pra ver que escrevo em português razoavelmente correto e sei fazer capas e miolos de livro bacanas. Na verdade eu sou produtora editorial, trabalho com design e com produção mesmo, as in fazer planilhas, redigir orçamentos, elaborar pedidos de recusa, montar pareceres, e todas essas coisas invisíveis que fazem do métier editorial um universo tão fascinante, tão plural

Se vocês souberem de alguma coisa na área (de preferência, uma vaga fixa), favor entrar em contato comigo. Meu e-mail é amanda.meirin@gmail.com.

Lembrando que também pego frilas de diagramação e faço projetos gráficos para qualquer tipo de material impresso (principalmente livros).

por Amanda Meirinho, em 2.12.10 | 0 comentário(s)




POEMINHAS

Faz mais de um ano que uma autora da casa entregou a compilação de algumas poemas seus para a publisher, que, educadamente, se recusou a publicá-los, porque, em linhas gerais, poesia não vende. O original foi entregue com discrição, como se a austeridade, cultivada pela autora junto com os livros sérios sobre história das relações trabalho no Rio de Janeiro, estivesse para sempre corrompida no primeiro verso de "batatinha quando nasce". Era poesia doce, que nada tinha a ver com a aspereza dos seus textos acadêmicos… um lado dela que nós, que não participamos de sua intimidade, não poderíamos sequer conceber.

Não guardei aquelas poemas, na verdade, nem quis lê-los. Sinto que invado o espaço do outro, já que não entendo poesia direito, acho verso tão emocionante quanto os e-mails que mando de vez em quando para alguns amigos pessoais. Mas às vezes faço meus poeminhas e, quando os releio, me sinto menina, pequena e sensível como a historiadora consagrada ao expor aquele pedaço de si para a publisher.

Por exemplo, esse poema, que escrevi esse ano, em abril. Gosto bastante dele, mas só consegui mostrá-lo para quatro amigos, três deles poetas bem melhores do que eu. Agora que o turbilhão passou, tomei coragem, e publico.

E, na madrugada de domingo, nosso abraço comprido
eu, seminua, você, não.
Reduzidos à porção mais íntima de nós mesmos, fomos capazes de nos amar plenamente nos quinze minutos que precedem o fim da madrugada e o raiar do dia,
mas só nesses quinze minutos, não mais.

No dia seguinte, somos apenas bons amigos,
e nos apressamos em classificar o indicidente íntimo de
"estranhíssimo".

Eu sou capaz de declarar meu amor a você numa hora dessas,
mas, quando o faço, minto.
Tanto que, quando você me perguntou o que eu murmurava entre os dentes, eu suspirei, e respondi
"bobagens"
porque sei que não sei mais o que sinto.

Despida da minha prepotência, me rendo à vida, que mais uma vez me dá uma rasteira,
e torço pra que você, menino, cresça junto comigo.

Gosto muito de você, querido.

Talvez eu devesse adotar um pseudônimo, algum nome que me fizesse me inserir nesse meio (a poesia) sem que minha imagem pessoal fosse ferida. Eu gosto de Zoé, acho um nome bonito, se combinasse com meus sobrenomes reservaria ele para uma filha. Zoé Zoé, que tal?

Esse outro é de 2006. Foi um ano que me fodi muito até começar a namorar com o François, em outubro, mais ou menos. O poema é de agosto. Na época eu estava gostando de um garoto, o que foi uma merda, porque eu não me sentia apaixonada por ele (pelo menos não do jeito que SEI me apaixonar), e ele até curtia sair comigo, mas nunca chegamos a namorar.

Vou-me embora meu bem que o dia já vai nascer
E muito embora eu desejasse abraçar você e tudo mais
Deixarei isso pra lá

Segurando sua mão bem junto à minha eu
Largo
E deixo cair da mesma forma que uma lágrima
Um olhar de raiva reprimida e tanto desgosto
Que não se sabe mais a diferença entre um naco de carne crua
E o seu gozo.

Deixarei isso de lado da mesma forma que sorrio quando o gosto é amargo
E tento cozinhar a fogo lento em um dia frio
Chocolate quente e queijo coalho
(suspiro).

Saudades dos dias quando eles eram mais compridos
Vazios
Muito embora goste da noite quando cai cedo
E o dia amanhece acanhado
É que a noite é para os apaixonados
É fato.

Vamos embora meu bem que o dia já vai nascer
E muito embora estejamos assim tão calados
Palavra pra quê
Um adeus mudo é um adeus bem dado

Eu nunca aprendi a usar mesóclise direito. Hoje em dia eu evito, acho pernóstico. Ninguém fala que "vou-me indo", né.

Na época em que escrevi esse poema era estagiária na Nova Fronteira, e tinha a tarefa inglória de avaliar os originais mandados pelos mortais (ou seja, pessoas sem referências), redigir pareceres, e enviar as tristes cartas de recusa. Depois de avaliar textos de cerca de 1.000 pessoas peguei uma espécie de repulsa, melhor, PAVOR por aqueles textos ruins em que os sonhos e expectativas do autor foram diluídos num aglomerado de palavras pomposas que não querem dizer muita coisa. Essa experiência me marcou profundamente, e me levou a evitar uma série de vícios de linguagem, em especial períodos de mais de três linhas.

Por outro lado, depois desse estágio eu praticamente parei de escrever por prazer. É foda, a gente adquire um senso crítico apurado, acaba sendo duro demais consigo mesmo.

O último poema foi revisto em 2006, mas foi desenterrado provavelmente de algum diariozinho meu de 2003.

E pouco a pouco me apaixono por você.
Guardo suas palavras bem vivas na memória
Decoro seu sorriso
e o repito em frente ao espelho.

Rabisco seus olhos grandes
Esboço rostos felizes
Sonho acordada mais do que dormindo
e suspiro.

Dou tempo
Semanas
Meses
Dias

Gosto de saber o que não sei
Gosto de saber que me apaixono
Não de vez
e sim devagar…
…calma, serenando

Por você.

Só me lembrei desse poema em 2006 depois de assistir um filme terrível sobre uma menina rica e maluca que seduz uma vizinha num verão no interior da Inglaterra. Rolou uma catarse imediata, mimimi de sair do cinema chorando (os bons entenderão). Entendo quem namora mulher não, cara.

Deu pra notar que eu só sei fazer poesia de amor. ESSA SOU EU ESSE É MEU CLUBE risos. Por trás desses 13.691 tweets e posts sobre tipografia também bate um coração.

por Amanda Meirinho, em 19.11.10 | 3 comentário(s)




PANÓPTICA

Essa obsessão toda em estar rodeada por objetos que parecem de brinquedo, trabalhar com o que gosta, evitar pratos duralex transparentes: a depilação pubiana é o espartilho da nossa geração. A geração dos meus pais foram os últimos adultos que conheci, ninguém mais cresceu por aqui.

A ansiedade permanente de que algo de grande aconteça na internet e eu esteja lá, ONLINE, absorvendo todas aquelas informações sem pai nem mãe. "Os primeiros a saber." E o mundo lá fora, nesse misterioso evento paralelo ao twitter, a TIMELIFE.

A solidão é meio frango de padaria apodrecendo entre o end e a home do google reader.

por Amanda Meirinho, em 12.11.10 | 2 comentário(s)




LIFE, GO EASY ON ME

Persiste em mim uma preguiça que me faz ficar feliz quando alguma coisa dá errado e eu acabo me desobrigando de uma grande responsabilidade, pra poder gastar meu tempo livre construindo réplicas de casas estilo "villa" no The Sims 2, vendo tumblrs pron, tergiversando sobre cultura nerd, bebendo cerveja em pé na esquina da minha casa (a Lapa), brincando com meu filho na pracinha. É minha barganha pessoal, minha auto-sabotagem, o flerte sem compromisso com a vida que faz de mim esse ser complexo chamado MULHER (gata).

Vida, pega leve comigo. Amor, não me deixa na pista. Forte abraço.

por Amanda Meirinho, em 12.11.10 | 0 comentário(s)




AH! ELIS! ELIS!

Comunicação, faixa 10 do Em pleno verão, disco de 1970 da Elis Regina, e, provavelmente, o disco que mais ouvi em 2007. O primeiro clipe é uma das coisas mais bonitas que a internet já me mostrou; o segundo foi postado só a título de comparação. Youtube, por favor, não tire esses dois vídeos do ar. Por favor.








E na rua sou mais um cosmonauta patrocinador /Chego atrasado, perco o meu amor /Mais um anúncio sensacional
.

por Amanda Meirinho, em 9.11.10 | 0 comentário(s)




MATURANDO A CAPA BRANCA

Conversando com o Fernando a respeito da capa branca, decidi criar outro desenho de manícula, que estivesse mais de acordo com as linhas curvas e não-curvas da Charter. O resultado foi um indicador afirmativo e autoritário.




A proposta inicial era usar a manícula da Wood Type, fonte de caracteres especiais do Adobe font folio que remete à xilogravura. Só que o desenho da Wood Type acima de 72 pontos não é muito bom, já que a fonte foi criada para se comportar em tamanho de texto apenas.




Com a criação da nova manícula, cheguei a alguns layouts de capa. A ideia é mostrar como direcionamentos ineficazes geram problemas de comunicação. Os elementos foram dispostos de forma ordenada e autoritária, remetendo às políticas públicas ineficientes que descaracterizaram a prática docente.


A melhor disposição dos elementos, ao meu ver, é essa:


O terceiro layout é mais "limpo" do que os outros. Foram feitas duas mudanças principais: primeiro, o corpo do título do livro, subtítulo e autores foi recalculado para se articular melhor com o tamanho reduzido das manículas. Depois, a disposição das manículas foi ajustada, para se alinharem de forma mais coesa ao grid.

Essas duas alterações aumentam os espaços em branco da capa, remetendo à diposição 1:3 do corpo de texto no miolo do livro.

Mas essa ainda não é a versão definitiva da capa. O layout precisa de ajuste fino, em especial no desenho das manículas. Não sei se vou ter tempo de chegar a um resultado final ainda mais coerente com o traço da Charter, porém. Só acho que estou no rumo certo.

por Amanda Meirinho, em 29.9.10 | 2 comentário(s)




UMA CAPA BRANCA

5. Papel branco, e até branco-puro. Sumamente desagradável para os olhos e uma ofensa à saúde da população. Uma leve tonalidade (marfim e mais escuro, mas nunca creme), jamais importuna, costuma ser melhor.
6. Capas brancas de livros. Igualmente consternadoras. São quase tão delicadas quanto um terno branco.
Jan Tschichold, A forma do livro.


Num primeiro momento apresentei um projeto de capa preto, como texto em branco, e os demais elementos em vermelho . Não funcionou. Porque a capa remete à xilogravura. O elemento visual mais presente é a adaptação de um dos ornamentos da Adobe Wood Type. Me pareceu mais coeso deixar a capa na cor natural do papel, ou seja, branca.

A capa branca remete ao leitor das suas responsabilidades com a conservação do livro. No caso, responsabilidade dobrada, já que a capa, além de branca, é não-laminada. Ou seja: qualquer mancha, qualquer descuido, qualquer ranhura é impresso pra sempre na capa do livro.

Do ponto de vista econômico, laminar encarece os custos de impressão em pelo menos R$0,30/livro. Ambientalmente, laminar significa colocar uma película de polipropilenoBiorientada (BOPP) e politereftalato de etileno (PET)sobre o livro; ou seja, plástico. E plástico não é biodegradável. Logo, laminar, além de encarecer o livro, polui.

Pessoalmente, acho que as marcas da leitura agregam história ao livro. Estamos acostumados à coisas lisas demais. Impermeabilidade é sinônimo de assepsia. Mas será que o livro ganha sendo asséptico?

Quantos leitores não usam as margens para anotações? A cola dos post-its, orelhas usadas como marca-páginas... marcas que servem para lembrar que livros foram feitos para serem lidos. Para serem manuseados, tocados e empoeirados. Sejamos honestos e deixemos o livro ganhar, e não perder, ao envelhecer.

E, bem, Tschichold também fez capas brancas. Talvez ele tenha entendido também o livro como um objeto orgânico. Não sei.



Mas é fato que esse livro soube envelhecer.

por Amanda Meirinho, em 21.9.10 | 2 comentário(s)




BIZARRE LOVE TRIANGLE

Fernando Meirelles enviou um e-mail para o pessoal da O2 Filmes, pedindo para que não acumulem muitos arquivos durante a gravação, e se limitem a guardar apenas o necessário para a edição final. Uma questão objetiva: falta espaço físico nos computadores da produtora, logo, é preciso que seja diminuído o número de informação a ser processada.

A discussão, calcada numa questão prática (time is money) foi alçada à posição de verdadeiro “manifesto” por parte da imprensa. A matéria "Fernando Meirelles lança manifesto contra farra digital" de Bruno Natal, publicada em 4 de julho de 2010 pelo jornal O Globo, põe “O método” na posição de verdadeira defesa ao “cinema de arte”.


Com cinema digital, queimaram-se etapas no processo de produção, como a revelação da película, mas foram criadas outras formas de se ocupar esse “tempo” vago; seja ao se fazer vários takes da mesma tomada, armazená-las, editá-las, etc.

Mas evitar a “gordura” não significa o retorno romântico à época em que o tempo parecia ser utilizado de forma mais cônscia. Significa, apenas, corte de custos. Sem surpresas: apregoamos a não-existência de “verdades”. A invenção mediática em cima de uma discussão prosaica, mas não inocente, faz parte do espetáculo.

O mesmo vale para outros produtos culturais. Com o esgotamento das vanguardas, não é mais cabível tecer convenções. A própria discussão estética é considerada ultrapassada. Valoriza-se o assombro, o drama, a performance. O resto é o resto.

Na literatura brasileira contemporânea, autoras como Paula Parisot espetacularizam a própria criação artística, criando performances como, no caso, o confinamento voluntário em um aquário de vidro numa livraria, com o intuito de promover seu último livro, "Gonzos e Parafusos".
Em tese,
(...) imersa no espaço branco, Paula encarnou a personagem de seu novo livro, "Gonzos e Parafusos", uma psicanalista quase esquizofrênica, que nutre verdadeira obsessão pela obra "O Retrato da Baronesa Elisabeth Bachofen-Echt", de Gustav Klimt -- ostentada na capa do livro. (fonte: http://www.colheradacultural.com.br/content/20100317223716.000.4-N.php).
É um discurso válido? É uma bobagem? Juízos objetivos não fazem parte do léxico pós-moderno. Na inexistência da “verdade”, everything goes.

Apadrinhada por Rubem Fonseca, autor que considera sua principal influência, Parisot não vende apenas seu livro. Vende seu espetáculo, sua performance.

Encontro de Rubem Fonseca com Paula Parisot durante a performance em questão

A simpatia de um autor consagrado basta para que o livro de Paula Parisot seja considerado, pelo menos, “notável”. No mais, permanece a atenção que a autora traz para si ao se expor, ainda que “pela arte”, num aquário de vidro numa livraria paulistana.

Mas não são todos os autores contemporâneos que parecem valorizar o papel da perfomance. Marcelo Mirisola, em sua crônica “Um novo animalzinho no Zoológico”, publicada em 24 de julho de 2010, ataca o posicionamento espetacularizado de vários autores contemporâneos, dentre eles Paula Parisot.
Caros leitores, queridas leitoras, tive paciência, eu juro, então eu disse, didaticamente, que o Rubem Fonseca, aquele velho sacana que saiu do Rio e foi até São Paulo pra dar sushi na boca da alpinista literária, a tal de Paula Parisot, estava apenas interessado em chupar a xota performática dela e, enfim, depois que lhe disse que a “performance” da amiguinha dele deixou o departamento de marketing da editora Leya feliz da vida e antes de lhe explicar como é que se abria uma retroxota com a ponta da língua, ou seja, no melhor da entrevista, o garoto, sublinhe-se estudante de Jornalismo, teve um chilique: ele me acusou de não entender nada de performances e artes plásticas, eu lhe disse que era exatamente por causa disso que escrevia livros, falei para ele criar vergonha naquela cara, e disse que, além de ingênuo, ele estava começando muito mal na profissão (...). (idem)
Se valendo de termos chulos, o autor parece defender o resguardo, por parte da “boa” literatura, em relação ao circo mediático. Não é, porém, um bom exemplo de crônica, já que Mirisola parece estar mais interessado em insultar seu interlocutor, o “viadinho cultural”, do que em expor, de forma coerente, seus pontos de vista.
E não tem mais, nem meio mais, você acha que jogar sinuca é performance? E chupar cu de mulata? Nesse momento, ele fingiu que não entendeu, e eu fiz questão de ser objetivo e explícito: escritor que é escritor, eu disse, não precisa fazer projeto, nem pesquisa, não precisa de planilha nem de cronograma, muito menos de performance, estou sendo claro ou será que você vai me reprovar porque, além de funcionário do Itaú, você também é da comissão que analisa projetos literários na Petrobras? (ibidem)
A leitura gera mal-estar: seria Marcelo Mirisola tão ignorante a respeito do que é uma performance a ponto de responder com estupidez à única pergunta feita pelo seu interlocutor, ou estaria ele cônscio do seu papel performático, interpretando, portanto, um prolongado esquete de humor duvidoso? Intencionalmente ou não, nasce daí o espetáculo.

Embora a crônica seja provavelmente o mais fluido dos gêneros literários, o texto em questão não é um bom exemplo. A jocosidade de Mirisola desperta, no máximo, consternação. O autor não trabalha bem com o arquétipo do “viadinho cultural” por ele criado; antes, reafirma seus preconceitos. Embora o grotesco seja um tema importante na criação literária, o texto de Mirisola tem a força de uma ofensa, e só.

Dado o cansaço da verdade, parece não ser mais possível apontar o “certo” e o “errado”, e sim o que, dado o contexto, parece apenas “adequado” e “inadequado”. A opinião de Marcelo Mirisola, a perfomance de Paula Parisot, a interpretação da imprensa dos e-mails de Fernando Meirelles aos seus funcionários: na constante inconstância contemporânea, as fronteiras entre manifestações discursivas se dissipam. Tudo parece se conectar em um grande espetáculo, porque não, teatral, sem que ninguém ouse ocupar o papel de servo da verdade (afinal, que verdade?) na construção dele.

É perigoso, porém, confundir fluidez com generosidade. Os discursos se multiplicam, mas não são absorvidos ou analisados, em especial os produtos culturais. Pelo contrário; as relações de poder persistem. O marginal continua marginal, o periférico, excluído, e o subdesenvolvido, pobre.

Numa bizarra solidão coletiva, existimos.

por Amanda Meirinho, em 10.8.10 | 3 comentário(s)




CHARTER ITC E O GRID 2:3

Acho engraçado como certas fontes parecem ter sido criadas para se comportar bem nesse ou naquele formato, tendo um desempenho mais ou menos satisfatório de acordo com o objeto proposto. Também me alegra ver que a escolha da tipografia rege absoluta a articulação dos demais elementos do design do livro, e a partir daí enxergar coerências e correlações que justifiquem a harmonia do projeto.


Com altura x elevada, olho adaptado para não ocupar com excessiva robusteza uma impressão offset, e modulações que lembram fontes clássicas, a observação da Charter ITC, de Matthew Carter, no miolo de um livro 14X21cm, é o tema do presente post.


QUANDO A FONTE É O GRID

Em posts anteriores comentei sobre minha relação obsessiva com grids modulares, de como considero importante articulá-los de acordo com a tipografia escolhida, e, se possível, adaptar o formato do livro para que as proporções matemáticas sejam respeitadas.

A fonte Charter ITC não foi minha primeira escolha para esse livro. Confesso que estava procurando por uma mancha bastante arejada, e, pelas minhas inclinações pessoais, pensei em um primeiro momento usar a Apollo, seguindo um grid definido anteriormente por mim para o formato 14X21cm. Não deu certo. Por quê? Porque um dos capítulos do livro vem com o uso excessivo do caractere "@" no corpo de texto, e Apollo, fonte criada em 1964, não vem com um @ articulado ao seu desenho. Portanto, optei por usar uma tipografia criada em 1993, e, para tanto, tive de adaptar meu grid à ela.

Charter ITC e Apollo são fontes com espíritos bastante diferentes. Enquanto a Apollo, atarracada e fluida, parece compor melhor tão mais arejada for a entrelinha, o mesmo não acontece com a Charter ITC.

Após alguns cálculos, optei pela seguinte articulação da Charter ITC no corpo de texto:


Não foi fácil chegar a esse resultado, porém. Para encontrar o tamanho de texto ideal para a Charter ITC, tive de rearticular o grid, e, principalmente, atentar para algumas questões no saber da fonte que se mostraram realmente fascinantes para mim.


ADAPTANDO O GRID


A tipografia de texto é pensada desde sua concepção para encaixar num formato, seguindo obcecadamente determinadas proporções até que se atinja a perfeição. Observar essas correlações é fundamental para que se mantenha a coerência na criação da mancha gráfica, e a harmonia do projeto como um todo.

O grid 1:1, apesar de matematicamente exato, não parecia cuidar bem de uma fonte mais "retangular" do que "quadrada". Fiz, então, algo que não costumo fazer: usei um grid 2:3, seguindo as mesmas proporções do formato do livro.


Grid 1:1, entrelinha de 15,25 pt


Grid 2:3: seguindo as mesmas proporções do livro.
Mantém a mesma entrelinha de 15,25 pt.

Apesar de, no caso, não alterar a percepção do livro o uso de um grid 2:3 em detrimento do 1:1, meu trabalho ficou mais fácil quando o adaptei. Tudo, de repente, pareceu se encaixar.


Surgiram várias correlações matemáticas no desenho da Charter ITC com o uso do grid 2:3. Observe: 1 indica a altura x (caixa baixa) da fonte, que ocupa 1/3 do eixo vertical do grid; 2 indica que um caracter da Charter ITC ocupa 1/2 do eixo horizontal do grid, e que mesmo com os ajustes de kerning, a coerência matemática é mantida; 3 indica a altura y da fonte.

O resultado, em um spread do miolo do livro:


Com o grid sobreposto; em vermelho, o espaço ocupado pela altura x da fonte no corpo de texto.


O resultado é uma mancha gráfica densa, sem o prejuízo da legibilidade. Porque a Charter ITC parece ter sido desenhada para ocupar 35% ou mais da entrelinha: no formato que segue as proporções 2:3, com o grid pensado de acordo com a altura x da fonte, 1/3 da entrelinha garantiu correlações geométricas bem-comportadas.


PS: Sobre as margens.
2:3 são as proporções de um retângulo áureo. Um retângulo áureo é formado por um quadrado e um retângulo composto por metade dos lados desse quadrado.

Para o livro em questão, adotei margens semelhantes às marcadas pelo diagrama de Villard, com algumas adaptações.



Sobreposição das manchas; em vermelho, a mancha definida a partir da proporção áurea; em azul, a mancha adotada. Em amarelo, o ponto áureo, determinado a partir do diagrama de Villard.



Mancha determinada a partir do cânone áureo. Os círculos pretos definem os pontos de interseção entre as retas traçadas e a definição da mancha. Proporções 2,6:3:4:6 para as margens.



A mancha adotada. Respeito aos cânones do diagrama de Villard, com a adoção de novos pontos de interseção para a definição das margens. Margem inferior e exterior definidas pela reta azul, marcada por metade da angulação entre a medianiz e a diagonal do livro.


por Amanda Meirinho, em 6.8.10 | 0 comentário(s)




DUAS CAPAS

Estabilidade e crescimento, análise histórica dos principais teóricos do desenvolvimentismo brasileiro. Trecho da quarta capa:

Os desenvolvimentistas poderiam alegar que de fato houve desenvolvimento, tendo em vista os índices de crescimento registrados nos anos 1950. Todavia, para os modernos-burgueses, que entendem ser o desenvolvimento o “bem maior” formado por dois bens em si ontologicamente distintos — estabilidade e crescimento —, as vitórias desenvolvimentistas teriam promovido o crescimento, mas não o bem maior.
Daniel de Pinho Barreiros


Para um livro austero, Gill Shadowed e Perpetua: pai e filha. Como que entalhados na pedra. Sem excessos, beleza fria. Os outros elementos seguem o mesmo grid fechadinho. Dois pantones, papel áspero e muita matemática para um livro que não pretende ser engraçadinho.


Educação, cultura e comunicação nas periferias urbanas coleção de ensaios feitos por uma turma de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação, Cultura e Comunicação da Faculdade de Educação da Baixada Fluminense, Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FEBF-Uerj).


Trade Gothic e Arnhem. Duas fontes com o mesmo espírito: dureza.

A fita é uma bobagem, eu suprimiria. Já fiz metáforas visuais mais felizes. Mas gosto do trecho do livro que está amarrado nela.

A ideia inicial era apenas usar uma página do livro rasgada, impresso no papel craft, mas acabei optando por algo mais fluido e, quem sabe, mais comercial. É que o livro fala de periferias de um modo geral; os artigos vão de Afrika Bambaataa ao MST às questões na relação professor-aluno. Não é fácil ilustrar um livro desses.

Só nas atividades. Até.

por Amanda Meirinho, em 23.7.10 | 2 comentário(s)




DESIGNER, SUJEITO AUTOR

Não sei se é culpa da forma como me relaciono com o mundo, mas é fato que de uns tempos para cá meus pontos de vista sobre arte têm sido pautados pelo julgamento d'"o que perturba" vesus "o que não perturba". E levo isso para tudo: do último clipe da Lady Gaga à exposição da Adriana Varejão.

Com meu trabalho não é diferente; embora eu não me considere uma artista, digo que um trabalho é bem-feito quando vai além do faz-caber. O problema é identificar o vai além. E, ao ler o artigo Designer as publisher, no Hyphenpress, me lembro das duas epígrafes iniciais para minha monografia, que, mesmo timidamente, não deixava de discutir o papel subjetivo do designer na criação de um livro:

Pode-se definir a tipografia como a arte de dispor corretamente materiais impressos de acordo com a finalidade específica de, ao arranjar dessa maneira as letras, distribuir o espaço e controlar o tipo de forma a ajudar ao máximo o leitor a compreender o texto.
Stanley Morrison

A arte é o pôr-se em obra da verdade.
Martin Heidegger
Entendo como responsabilidade do designer buscar alusões, de preferência facilmente compreensíveis pelo público leitor, entre o material textual que compõe o livro e seu projeto gráfico. E isso vale para todo e qualquer trabalho. Buscar no extenso léxico visual deste as metáforas que lhe sejam mais precisas é um exercício de sensibilidade, onde nem sempre as soluções mais simples são as mais adequadas.

O problema é: adequadas por quê?

Em geral, julgo inapropriado julgar a adequação deste ou daquele projeto baseando-se apenas em manuais regras tipográficas. Porque levando em conta apenas a tradição costuma-se deixar em segundo plano o papel autoral que muitos designers relutam em admitir, mas, que,via de regra, assumem, na composição das narrativas visuais dos livros que compõe.

A questão é entender as escolhas adotadas pelo projetista enquanto autor “visual” do livro sem classificá-las como ditadas apenas pelo “gosto pessoal”; portanto, subjetivas. Eu busco justificar essas escolhas por outro viés, onde é possível classificar o design editorial como uma espécie de “arte do livro”, do ponto de vista hermenêutico. Afinal, embora poucos projetistas considerem seu trabalho como artístico, é difícil não contemplá-lo como tal.

Pode-se dizer que a resposta do porquê da adequação como é certo para mim persiste. Mas a definição me parece mais ampla: É certo para mim porque sou capaz de perturbar para que mundo enxergue que é certo.

Se cada um pautasse sua percepção apenas a partir da sua própria experiência, não haveria espaço para o coletivo na criação artística. Quando o designer consegue convencer o mundo de que seu produto é um produto cultural, que condensa o espírito de mundo, ele é feliz.

A busca pela adequação entre palavra escrita e os signos imbuídos nas narrativas visuais é uma tarefa cansativa e, muitas vezes, uma armadilha para o designer. O segredo parece estar em não sobrepujar uma narrativa à outra, e buscar, sempre, que ambas caminhem lado a lado na apresentação física do objeto livro.

As soluções, porém, nunca são simples o suficiente para serem condensadas em súmulas. Em um trabalho onde não há fórmulas que não tenham sido derrubadas pela última vanguarda, vivemos em crise identitária, que reverbera em todo fazer que possa ser considerado como "artístico". As variáveis são muitas, e partem desde a observação empírica pura e simples do belo, até cálculos matemáticos para que se encontre a harmonia em uma folha de papel com texto impresso.

por Amanda Meirinho, em 12.7.10 | 0 comentário(s)




YOUR LUNACY FITS NEATLY WITH MY OWN

Em 3 de maio, o André Duchiade lembrou, no twitter, que
# Uma boa alma subiu uns vídeos incríveis do Wyatt - www.youtube.com/watch?v=0cOkUieKjNM e www.youtube.com/watch?v=7zXFE3lcFMo
10:39 AM May 3rd via web
Robert Wyatt me sensibiliza. Esses vídeos, em especial, o de Sea Song, acabaram comigo.


Robert Wyatt teve uma consistente carreira musical antes de ficar paraplégico. Em primeiro de junho de 1973, aos vinte e oito anos, durante uma festa, pulou de uma janela do terceiro andar. Em consequência, perdeu seus movimentos abaixo da cintura. Logo depois, lançou Rock Bottom. Tanto Sea Song quanto Alifib são desse álbum.


Não sei o que mais me aterroriza nessa apresentação ao vivo de Sea Song.

A voz de Wyatt nessa gravação é perturbadoramente diferente daquela de Rock Bottom: é mais fanha, mais grave. Vê-lo numa cadeira de rodas também é estranho. Para mim, ele surge como uma aberração de circo; sentimento ruim, eu sei, mas é impossível escapar dele.



Segundo a Wikipedia, esse não é o único registro de Wyatt se apresentando em uma cadeira de rodas. Quando o cover de I'm a Believer alcançou a posição #29 no Top of the Pops,

Aconteceram várias discussões pesadas com o produtor do Top of the Pops com relação a seu desempenho em "I'm a Believer", tendo como base que sua aparência em uma cadeira de rodas "não era apropriada para os olhos de uma família". O produtor queria que Wyatt aparecesse em uma cadeira normal. Wyatt venceu a discussão e 'perdeu os panos mas não a cadeira de rodas'('lost his rag but not the wheel chair', provavelmente alguma expressão em inglês), e se apresentou de forma contrária.




Ao contrário de I'm a beliver, há algo que me escapa nessa imagem de Wyatt em Sea Song, algo que faz dele um verdadeiro artista, e não apenas um musicista. Um retrato definitivo e cruel da loucura, do gênio artístico, ou dos dois? Não sei definir.

Dizem que toda obra artística é passível de se classificada como tal devido ao "assombro" que provoca; e Wyatt em Sea Song me traz diversas sensações, para além da catarse pura e simples. Sua fragilidade me comove. Sua voz embargada me dá arrepios. Sua lírica ensandecida não me é indiferente. É simplesmente belo e perturbador, como poucas coisas são na música pop.

Depois de conhecer essa gravação, os registros de estúdio de Sea Song me decepcionam. Sinto falta da histeria vocal, da interpretação profunda e triste para poesia poderosa.

You look different every time you come
From the foam-crested brine
Your skin shining softly in the moonlight
Partly fish, partly porpoise, partly baby sperm whale
Am I yours? Are you mine to play with?
Joking apart - when you're drunk you're terrific when you're drunk
I like you mostly late at night you're quite alright

But I can't understand the different you in the morning
When it's time to play at being human for a while please smile!
You'll be different in the spring, I know
You're a seasonal beast like the starfish that drift in with the tide
So until your blood runs to meet the next full moon
You're madness fits in nicely with my own
Your lunacy fits neatly with my own, my very own

We're not alone

Sim, Wyatt. Você não está só.

por Amanda Meirinho, em 5.5.10 | 3 comentário(s)




AND SOMEONE SAVED MY LIFE TONIGHT, SUGAR BEAR

Sou extremamente sensível às coisas que vêm do coração, e essa declaração de amor de Elton John à ribalta me emociona. Não que eu busque me identificar com a canção, o que de fato faço, pois sou extremamente egocêntrica, mas esse falsetto, essa energia, esse poder... não tenho como afetar frieza diante da criação artística.




A faixa é um ode ao egoísmo de Elton John. A letra, de Bernard Taupin,
se refere a algum momento em 1969, antes do cantor se tornar famoso, quando ele considerava se casar com sua namorada, Linda Woodrow. Ambos estavama dividindo um apartamento com Taupin na rua Furlong no East End londrino, o que é evidente pela estrofe inicial da canção, "When I think of those East End lights". Confuso, John chegou a considerar o suicídio. Ele procurou apoio em seus amigos, especialmente Long John Baldry, que convenceu o cantor a abandonar seus planos de se casar e levar adiante sua carreira artística. Como sinal de respeito e gratidão por Baldry, Taupin o inseriu na letra como "someone" em "someone saved my life tonight", e como o "Sugar Bear" mencionado mais adiante. (fonte: Wikipedia, http://en.wikipedia.org/wiki/Someone_Saved_My_Life_Tonight)
Não tenho pena de Linda Worrow. De noivas abandonadas o inferno está cheio. Me admira, sim o colhão de Elton John, em companhia de seus amigos, por terem composto algo assim.

And it's one more beer,
And I don't hear you anymore.
We've all gone crazy lately,
My friend's out there rolling,
Round the basement floor.


Elton John e Bernard Taupin, jovens. © The Elton John Archive

A letra é um longo desabafo contra a pretensa opressão da união estável versus o espírito livre do artista. Uma mulher que já não é mais companheira de um homem que vê nela um empecilho para brilhar. Cruel? Sem dúvida. Observem:

You nearly had me roped and tied,
Alter-bound, hypnotized,
Sweet freedom whispered in my ear
You're a butterfly,
And butterflies are free to fly,
Fly away, high away bye bye.


Uma vez distanciado o contexto inicial em que a canção foi criada, no caso, o fim de um relacionamento saturado, sobram versos poderosos, otimistas e, porque não, imaturos. Entusiasmados.

And I would have walked head on
Into the deep end of the river,
Clinging to your stocks and bonds
Paying your H.P. demands forever.
They're coming in the morning
With a truck to take me home


Novamente, não sei qual a relação entre Elton John e Linda Worrow. Considero desrespeitosa, porém, a ideia de que a arte nos liberta do nosso lado mais sombrio. Sou pessimista. Quanto mais nos movemos, mais pesadas são as correntes que nos prendem ao mundo, e Elton John, Bernie Taupin, Linda e o Sugar Bear Baldry já devem ter notado isso.

Precisa de legenda? © The Elton John Archive

O que só torna o vídeo de 2006 de La Chapelle mais fantástico. É o timing da vida, gente, sendo irado como sempre. Não é?

por Amanda Meirinho, em 26.4.10 | 1 comentário(s)




FERRIS BUELLER'S DAY OFF

Ontem resolvi apresentar John Hughes para minha vizinha de oito anos. Não consegui. Os primeiros minutos de Curtindo a vida adoidado, dublado, foram o suficiente para ela achar o filme estranho, e ir para o computador jogar paciência. Não a culpo... coloquei o dvd no áudio original, e, recostada em um pufe, me dediquei à tarefa de mais uma vez me emocionar com esse clássico da Sessão da Tarde.


Ferris Bueller's day off é um filme melancólico, que trata de temas complexos, caros à idade inventada da adolescência, que se perdem nos cortes das exibições do filme na televisão. É a história de um rapaz egocêntrico, impossivelmente magnético, pretensioso e arrogante, que resolve aproveitar ao máximo um dia de verão.

Os motivos de Ferris para curtir são simples. Por ser a nona vez que falta à escola àquele ano, ele sabe que será difícil repetir a empreitada; e esse é seu último ano no colégio: as responsabilidades de jovem adulto se anunciam como o inevitável golpe de estado popular para um caudilho sul-americano. Portanto, imbuído do carpe diem ilusório de "ei, tem-se 16 anos somente uma vez, 'vamos curtir'", Ferris liga para seu melhor amigo deprimido, Cameron, e dá um jeito de tirar da escola sua namorada, Sloane, a fim de aproveitar ao máximo um dia ensolarado ao lado dos dois.

O que se segue é uma sucessão de acontecimentos divertidos e melancólicos, onde o egocentrismo de Ferris é usado para fazer desse o dia mais feliz de sua vida e de seus amigos. Sua camaradagem com Cameron é impressionante: o rapaz está perdido em suas próprias dores inventadas, "tão tenso que", nas palavras de Ferris, "se botassem um pedaço de carvão no rabo dele, dali sairia um diamante". É extremamente invasiva a postura de Ferris para fazer do amigo o que ele considera um homem, e, ao mesmo tempo, deliciosa a tensão criada a partir do carpe diem forçado.

A frieza arrogante e camarada de Ferris para com seu melhor amigo precisa ser quebrada em diversos depoimentos do rapaz para a câmera, pois nem o próprio espectador consegue compreender suas verdadeiras intenções. E, mesmo abrindo seu coração para nós, o charme de Ferris Bueller faz dele too cool for school, colocando seu melhor amigo na confortável posição de coadjuvante de si mesmo. Cameron é um panguá, Ferris, é o anti-panguá. É uma amizade e tanto.


Sloane, a namorada de Ferris, é uma menina lânguida e sofisticada. Uma dama de dezesseis anos, que não leva o namoradinho à sério, pois não enxerga nele (e nem pretende enxergar) um Homem Apaixonado. De certa forma, a frieza de Ferris a contamina, e, embora não aparentem desconforto, Sloane e Ferris sabem que o relacionamento entre os dois é, provavelmente efêmero. Ferris constata isso quando pede Sloane em casamento na bolsa de valores, enquanto Cameron, solitário, imita os gestuais yuppies, e ela ri do namorado. Mas ele está falando sério: novamente, é preciso que Ferris olhe para a câmera e explique para nós, espectadores de seu carisma, suas intenções e sentimentos. Seu excesso de segurança o trai. Ele não aparenta ser louco pela menina, e nem ela por ele, muito menos têm os dois maturidade para extrair dessa tranquilidade material para enxergar daí um casamento. Cameron, pessimista, faz um comentário sobre a vida a dois arruinada de seus pais. É uma cena extremamente triste.


Quase tão cruel quanto a declaração de Ferris à Sloane é àquela em que ele se aproxima de uma parada e sobe no carro alegórico, deixando seu amigo e sua namorada temporariamente excluídos de sua felicidade. Ambos olham para Ferris com um misto de admiração e censura: seriam eles capazes de fazer o mesmo? Provavelmente, não. Ferris é impossível, de um charme juvenil que faz dele objeto de desejo e admiração por todos ao seu redor. Como diria Grace, a secretária do colégio, "The sportos, the motorheads, geeks, sluts, bloods, waistoids, dweebies, dickheads - they all adore him. They think he's a righteous dude."

Em sua solidão, Sloane, a columbina, e Cameron, pierrô, se dedicam a destrinchar o charme egocêntrico de Ferris, o arlequim. Ambos estão felizes por serem, acima de tudo, amigos do rapaz. Cameron começa a enxergar a vida com novas cores, e, ao meu ver, ele e Sloane flertam nessa cena. Inevitável: dezesseis anos, RESPIRANDO, nada mais normal do que flertar com o melhor amigo panguá do seu namorado.

Nada, porém, se anuncia. Ferris está tendo o SEU momento. Shake it all baby, twist and shout. Resta aos seus amigos abandonados esperar que ele saia do pedestal, e, sendo impossível reprimir seu comportamento, admitir com doçura a coadjuvância de suas próprias vidas.

Papel esse que Jeannie, irmã de Ferris, reluta em aceitar. Ela tem raiva. E tem razão: todos amam seu irmão, e ela, que nem namorado tem, só é lembrada por ser a irmã de Ferris Bueller. Jeannie é uma imagem patética da frustração, pois ela sabe que ninguém vence Ferris, mas não entende que não cabe a ela desmascará-lo, ou, simplesmente, desafiá-lo. Ela e Ed, o diretor do colégio, se lançam nessa tarefa, e, por ser esse um filme da Mtv sobre Ferris Bueller e não sobre outro adolescente qualquer, se dão muito, muito mal. Em níveis diferentes, claro. Pelo menos Jeannie ganhou um beijo de um desconhecido que mexeu sexualmente com ela. Pobre Ed. Dirt Harry às avessas.

Não há nada de transgressor no comportamento de Ferris. Ele é narcisista, como a maior parte dos jovens acha bonito ser. O julgamento do diretor da escola e de sua irmã é preciso, mas nada o atinge: ao final, Cameron, Sloane e Ferris conseguem se safar, cada um a seu modo, de ter seu dia arruinado. Cameron deverá enfrentar a ira de seus pais, o que parece ser necessário para que daí ele consiga, enfim, tomar prumo na vida; Sloane não tem o que temer, pois está com Ferris, cuja estrela brilha por ela, e, em um grau menor, para ela; e Ferris é Ferris.



Uma desconcertante mensagem é deixada porém, como uma despedida da adolescência rumo à idade adulta. Talvez Ferris, Cameron e Sloane tenham continuado amigos, talvez suas vidas tenham tomado novos rumos e o amor os tenha dilacerado. Não há como mensurar o impacto da idade adulta, imposta no momento mais esfuziante de suas curtas vidas. As reticências se espalham ao final do filme, como as primeiras estrelas que brilham no céu ao final daquele que foi, sem dúvida, o dia de folga mais importante de vida de Ferris Bueller. Nas palavras dele: "Life moves pretty fast. If you don't stop and look around once in a while, you could miss it."


*
*
*





Irado o timing da vida, Ferris. Irado.

por Amanda Meirinho, em 12.4.10 | 5 comentário(s)




EU VOU E VOLTO ENTRE TEUS RINS

Haters gonna hate, mas, taí um homem de verdade.



Recortaria a cara da Jane Birkin e colocava a minha nesse vídeo de boa. É uma das coisas mais tocantes que já vi na internet. Estou realmente emocionada.

Parece que a versão original dessa chanson foi feita originalmente em 1968, época em que o Gainsbarre estava com ninguém menos, ninguém mais, do que Brigitte Bardot. A bela implorou para que a gravação não fosse posta em público, pois ameaçaria seu casamento, e Serge, perfeito cavalheiro que era, atendeu seu pedido. O amigo André Duchiade, que me chamou a atenção recentemente para a obra poética de Gainsbourg, me disse que a gravação com a Bardot é ainda mais ardente do que a escandalosa versão que veio ao público, mas, eu ainda não a ouvi.

Outro bom vídeo, com uma vibe menos feliz, cuja historinha eu, infelizmente, não conheço.



Joakim, Lonely Hearts, 2007. Dirigido por Camille Enrot.

por Amanda Meirinho, em 6.4.10 | 2 comentário(s)




HEAVENLY ARMS SOFT AS A LOVE SONG

Sei que é bobagem dizer que only a woman can love a man, já que um homem pode amar um homem e uma mulher, o quê ela quiser, mas o verso de Lou Reed ganha, para mim, o peso especial das belas mentiras. É como quando me explicaram a diferença do amor que um homem ter por uma mulher (em específico) e o amor de Deus pelas suas criancinhas, e quando eu entendi que a forma mais próxima de um homem e uma mulher se amarem nasce sempre de um beijo.

A emoção dos teclados de Take my breath away, as noites perdidas armando em detalhes o beijo com o menininho louro do pátio, a experiência devastadora da primeira desilusão amorosa, a contenção, a histeria juvenil, a verborragia.
Lovers stand warned of the world's impending storm.

Heavenly arms come to my rescue
Only a woman can love a man
In a world full of hate, love should never wait
Heavenly arms reach out to me

Heavenly arms strong as a sunset
Heavenly arms pure as the rain
Lovers stand warned of the world's impending storm
Heavenly arms reach out to me

.

Lou Reed, você me mata.

por Amanda Meirinho, em 17.3.10 | 0 comentário(s)




BADLY KERNED GIRL

É um desejo antigo, esse, de criar uma banda type geek em resposta ao Badly Drawn Boy, nascido na época em que a expressão "badly kerned" começou a fazer parte do meu vocabulário corrente enquanto gostosa e profissional do livro (sic). Só que eu ainda não tinha aberto o photoshop e tornado esse desejo realidade.

Talvez eu devesse ter espacejado grotescamente os meus olhos, a fim de transformar meu próprio rosto num sonoro "BADLY KERNED GIRL". Bem, essa decisão fica ao cargo dos meus agentes (literários). Karen Shindler, talvez. Visionária.

por Amanda Meirinho, em 16.3.10 | 1 comentário(s)




INTERLÚDIO: VIDA DE CASAL

Embalei o sono de Bruno com a história da extinção de uma civilização pré-inuit na Groenlândia medieval, o fracasso de Scott na Antártida, e o encontro de Stanley com David Livingstone no coração da África. Comentei também meus trechos favoritos de Lorde Jim, onde enalteci histórias sobre o fracasso, frequentemente superiores àquelas em que se alcança o sucesso com prudência e inteligência, tal qual a "conquista" real de Amundsen dos pólos norte e sul. Deveria ter comentado A Esfinge de Gelo, mas li Jules Verne na infância, de forma que minha memória sobre esse livro não está tão fresca quanto a do romance de Conrad, que li duas vezes: aos doze e aos dezessete anos.

Aproveitei para declarar meu amor à literatura "infantojuvenil" imperialista, em especial aos relatos reais, onde aventureiros arrogantes, tal qual Allan Quatermain, se embrenham em lugares "onde o homem branco jamais pisou" em busca de riquezas sem valor sentimental. Indiana Jones, Marlow, Henry Stanley, no mundo "real". O estúpido que se perdeu na selva brasileira, e teve sua suposta ossada encontrada por Rondon. Capitão Ahab, e o caixão de Quiqueg boiando no mar. Os livros de Jack London em que cães que se tornam lobos, e lobos se tornam cães; O Chamado da Floresta, Caninos Brancos e O Lobo do Mar. Paixões impossíveis, vontade de potência, teimosia.

Terminamos nossa conversa com pareceres sobre a vida sexual dos nossos amigos, e o barulho do choro solitário do Arthurzinho, que não conseguia dormir com as vozes entusiasmadas de seus pais no quarto ao lado.

A solidão é meio frango de padaria apodrecendo na lixeira do seu vizinho.

por Amanda Meirinho, em 15.3.10 | 2 comentário(s)




AN INTERVIEW WITH EL PERRO DEL MAR



Realmente amo tudo que a Sarah Assbring faz. Quando ela canta que nem uma garota retardada que você não tiraria para dançar porque é magra demais, quando ela diz que o nome do terceiro álbum dela é uma citação de Marlon Brando em O último tango em Paris, quando ela faz o Tim Maia e desiste de tocar no Rio porque passou mal no Hotel Glória. É um amor incondicional, tietismo mesmo. Musa.

por Amanda Meirinho, em 11.3.10 | 0 comentário(s)




GIGANTES DA LIRA


Na General Glicério, por volta das 8 da manhã de domingo.

A barba não durou quarenta minutos. O cabelo, então, virou um coque em meia hora.

Mais fotos de crianças no Gigantes da Lira no Das Ruas.

por Amanda Meirinho, em 7.2.10 | 0 comentário(s)




O DESIGN DE LIVROS BRASILEIRO: TRADIÇÃO E INOVAÇÃO NO SÉC. XX

Da chegada da imprensa ao Brasil até os tempos modernos

Ao contrário de grande parte dos inventos desenvolvidos pela humanidade ao correr dos séculos, o livro impresso já nasce, per si, como um objeto de alto padrão tecnológico. É a introdução à mecanização de uma peça há muito sofisticada: sua composição é fruto de cálculos exatos, seu formato, orgânico, não deixa dúvidas ao “usuário” de como utilizá-lo, e seus fins — a leitura! — plenamente compreensíveis. E, desde cedo, este objeto já foi pensado para ser belo; basta um breve olhar na famosa Bíblia de 42 linhas, desenvolvida em aproximadamente 1450-55 por Gutenberg, para compreendê-la como um item de luxo.

A imprensa só chega ao Brasil em 1808, com o aporto da família real portuguesa ao Rio de Janeiro. Tamanho atraso não significa, porém, que o país esteja defasado em relação ao design de livros mundial; a produção brasileira é considerada bastante profícua, criativa, e tradicional. Isso se dá por várias razões: em primeiro lugar, a inserção do país às novas tecnologias da indústria gráfica se deu concomitantemente ao desenvolvimento destas em seus países de origem, como a Inglaterra e a França. O Brasil não estava de forma alguma fechado a esse advento fabril em específico. Graças a políticas internas capazes de incentivar a literatura brasileira por parte do imperador D. Pedro II, o livro nacional não foi tão impactado pelos embargos impostos à industrialização no Brasil de meados do século XIX. Além disso, pode-se dizer que, dadao aporto tardio da imprensa, o país estivesse até mais aberto a essas mudanças significativas na forma de se pensar um objeto impresso do que países ditos centrais, onde a confecção destes data de meados do século XV (CARDOSO: 2005, p. 164).

Depois, essa nova forma de se pensar o impresso ecoou de diversas formas pelo mundo. Surgem os cartazes, as fontes fat face, e algumas “heresias” tipográficas no mercado editorial que fazem muitos considerarem o séc. XIX o período mais baixo da tipografia (TSCHICHOLD: 1966). O exagero parecia reger os impressores, ávidos por apresentarem o uso, por vezes irracional, da maior quantidade de tipos possíveis num mesmo impresso, a fim de atestarem a posse destes (LUPTON: 2006, p. 25).

Fala-se aqui, pela primeira vez, de veículos para as massas. O século XIX trouxe ao mundo rótulos de embalagens com cores vivas e brilhantes, cartazes minuciosamente ilustrados, livros infantis com capas ricamente decoradas, tipos “fantasia”, tudo graças a processos gráficos como a cromolitografia, a litografia, e a zincografia (LUPTON: 2006, p. 25). O impacto é tão significativo que obras literárias como As Ilusões Perdidas, de Balzac, chegam a discutir a questão de forma consistente, no caso, com a figura do impressor e desenvolvedor de papéis David Séchard. Todo um novo vocabulário foi criado na comunicação visual do período, cujo impacto, no Brasil, não pôde deixar de ser sentido.

E, nesse país absolutamente virgem no que tange a produção industrial de impressos, surgiriam algumas das idéias mais criativas no design editorial, personificadas por editores como Garnier e Laemmert, e merecendo destaque o caráter inventivo e renovador de suas obras ilustradas. Até as primeiras décadas do século XX, era pouco usual o uso de capas ilustradas. No mercado livreiro nacional, as capas feitas pelo pintor José Wasth Rodrigues para a editora Monteiro Lobato & Cia. (reorganizada posteriormente como Companhia Gráfica-editora Monteiro Lobato), sob coordenação do editor-chefe Monteiro Lobato, entre 1919 e 1925, rompem com o padrão vigente das capas tipográficas. O livro Urupês, de autoria do próprio dono da editora, com capa ilustrada por Wasth Rodrigues, “marcaria [segundo o senso comum] o início do design de capas no Brasil, bem como um ponto de partida para a reconfiguração dos projetos de livros de modo geral, incluindo maior atenção à qualidade tipográfica e à diagramação do miolo” (CARDOSO: 2005, p. 165).

Iniciativas como essa são consideradas decisivas, de fato, para o refinamento da construção do livro nacional, muito embora não tenham sido isoladas, dado o contexto sócio-cultural da época. Nos anos pós Primeira Guerra Mundial, vanguardas artísticas estabeleceram novos paradigmas no entendimento da arte, cidades provincianas se elevaram ao posto de metrópoles, e a mídia brasileira, imersa nesse contexto de grande transformação, se tornou o canal privilegiado para a tradução de toda essa “nova ordem” ao público nacional.

O Brasil tornava-se moderno a olhos vistos, adquirindo auto-suficiência no mercado editorial à medida que dominava os meios de produção para a criação e concepção de livros. Novas editoras foram estabelecidas a partir de 1920; a Monteiro Lobato & Cia, que em 1925, é dissolvida, tornando-se em 1925, com a direção de Octalles Marcondes Ferreira, a Companhia Editora Nacional (CARDOSO: 2005, p. 172), Waissman Koogan, atuante até hoje sob o nome Guanabara Koogan, e, mais posteriormente, a Civilização Brasileira das décadas de 1950-1960, são alguns dos nomes mais influentes. Mas, “para além da reorganização comercial do meio editorial, faz parte desse processo de modernização uma nova concepção do livro como objeto gráfico industrial” (CARDOSO: 2005, p. 176). O design — observando aí o “tratamento dispensado como um todo, desde a sua construção tridimensional (…) até sua impressão, diagramação e ilustração” (CARDOSO: 2005, p. 176) — passou a quase fazer parte do cotidiano.

Embora todos os avanços na concepção do livro de época tenham sido significativos, para muitos figuraríamos ao lado de Portugal como países do livro feio (FREYRE: 1925), pois o impresso, de uma forma geral, ainda “não havia alcançado um padrão gráfico que satisfizesse seus leitores contemporâneos mais exigentes” (CUNHA LIMA, FERREIRA: 2005, p. 200). A afirmação de Gilberto Freyre é injusta, se for observado o rigor técnico da própria imprensa régia, onde é possível encontrar livros realmente belos em um país com tradição tipográfica tão recente. Bem posteriormente, o trabalho de profisisonais como Tomás Santa Rosa, artista capaz de “expressar modernidade e brasilidade, obtendo um resultado estético surpreendente” (CUNHA LIMA, FERREIRA: 2005, p. 205) refutariam novamente a afirmação de Freyre, mesmo lidando com a escassez material da editora José Olympio de fins da década de 1930.

Da esquerda para direita: capas de Eugenio Hirsch, Victor Burton, e a coleção Debates

Na década de 1950, nomes como Eugenio Hirsch promoveriam uma verdadeira ruptura com a organização tradicional das capas de livros nacionais, ao operar como legítimos desconstrutores da grade tipográfica. Movimentos artísticos incipientes como a pop art influenciariam de forma definitiva o design da época, produzindo livros belos e de identidade visual fortemente marcada, tornando-os peças indefectíveis de design: mesmo projetos de cunho tipograficamente mais rígidos, como a coleção Debates, até hoje republicada pela editora Perspectiva, mantêm suaunidade, sendo atualmente um exemplo clássico, de “limpeza, precisão, legibilidade, clareza, código. Sistema.” (HOMEM DE MELO: 2005, p. 97). O trabalho de Victor Burton para a editora Nova Fronteira também não pode deixar de ser citado; suas linhas clássicas, tangenciadas pelo uso frequente de fotografias em capas de livro (PERROTA, 2003) traça um estilo próprio dentro do design tipográfico das décadas de 1970 e 1980, distanciando-se do olhar ruidoso de cartunistas como Jaguar, Clauco e Ziraldo enquanto capistas, ou do já citado Hirsch, cuja máxima, “’Uma capa é feita para agredir, não para agradar’” (HOMEM DE MELO: 2005, p. 62) marcaria o design de toda uma época.

Em meados da década de 1980, editora Companhia das Letras adota uma visão mais “europeizada“ na construção do projeto de seus livros, consolidada pelo trabalho do próprio Victor Burton, tradição esta mantida pelos projetos gráficos da editora 34, criada no início da década de 1990. Não é possível, porém, embasar esse pensamento além da observação empírica do projeto gráfico dos livros dessas editoras, ainda em plena atividade mercadológica.

Este trabalho não se concentra, porém, em esmiuçar a produção editorial brasileira do século XX. O Brasil aqui é visto como um país cujo design de livros “é a mais consolidada tradição do design no país” (HOMEM DE MELO: 2005, p. 58), e não como o país “do livro feio”. Mas, ainda dentro de um panorama histórico, é fundamental citar aqui o nascimento, em 1996, de uma casa editorial amplamente elogiada pela imprensa especializada: a Cosac Naify.

por Amanda Meirinho, em 21.12.09 | 0 comentário(s)




fevereiro 2009 > março 2009 > abril 2009 > maio 2009 > junho 2009 > julho 2009 > agosto 2009 > setembro 2009 > outubro 2009 > novembro 2009 > dezembro 2009 > fevereiro 2010 > março 2010 > abril 2010 > maio 2010 > julho 2010 > agosto 2010 > setembro 2010 > novembro 2010 > dezembro 2010 > janeiro 2011 > fevereiro 2011 >

"Nem por todo chá na China" é uma corruptela da expressão "nem por todo o chá da China", que quer dizer "nem que a vaca tussa", "nem daqui a mil anos", ou, enfim, "nunca". O título é uma tradução livre de um trecho de All my Little Words, The Magnetic Fields: Not for all the tea in China/Not if I could sing like a bird /Not for all North Carolina/ Not for all my little words.

Header: Leda e o Cisne, Giampietrino, 1495–1549.

rss | portfolio |e-mail | linkedIn | facebook | last fm | twitter | tumblr